O EVANGELHO DE MATEUS – ANO A


Introdução: A Bíblia, antes de ser escrita teve sua mensagem sentida, vivenciada, discutida e comunicada de pais para filhos, de catequistas para catequizandos (Dt 6,4-9.20-25). A experiência de um Deus presente em sua vida, em suas vitórias e derrotas. Experiências contadas, recontadas, cantadas e rezadas. Assim o texto nasce como revelador da presença de Deus na vida e passa a ser reverenciado como texto sagrado.

            Quando o caminho pela frente parecia muito escuro, o povo relia o texto sagrado para que sua luz se esparramasse pela vida afora. O texto era como uma lanterna nas mãos do povo para iluminar o caminho a seguir: “Tua Palavra é lâmpada para os meus pés, e luz para o meu caminho” (Sl 119,105).

            O texto de Mt também nasceu do dia-a-dia das comunidades espalhadas pelo norte da Galiléia e Síria entre os anos 80-90 d.C. A experiência da comunidade, da pessoa de Jesus foi tão forte, que elas diziam e repetiam: Ele está no meio de nós! (1,23;18,20;28,20).

            Na base do evangelho de Mt está a missão de Jesus, o Semeador do Reino. Os ensinamentos e parábolas de Jesus nascem de sua experiência de homem do campo, como vemos na parábola do semeador (13,4-9), um pequeno retrato da vida dos camponeses do tempo de Jesus: um solo árido, pedregoso... não obstante os obstáculos, o semeador realiza seu trabalho confiante na qualidade da semente que está lançando. Ela servirá de comparação para mostrar o que acontecerá com o Reino de Deus. Apesar de toda a resistência, ele chegará a uma plenitude inesperada. Como a semente lançada ao chão produziu fruto, a Boa Nova de Jesus, expressa por sua vida, palavra e prática, fez surgir os Evangelhos.

 

I – Estrutura do Evangelho de Mateus. Como texto catequético para as comunidades que viviam a sua fé na presença de Jesus, em meio a muitos problemas internos e externos, é possível perceber que Mt juntou, organizou, acrescentou ou modificou as várias tradições orais e escritas das palavras e da prática de Jesus para responder à situação concreta de suas comunidades.

            Não esqueçamos que o evangelho de Mc já circulava no meio das comunidades. 80% de seu texto aparecem em Mt. Tanto Mt como Lc tiveram outras informações além de Mc, uma fonte que reúne os ditos ou palavras de Jesus. Além dessas duas fontes, vamos encontrar elementos que só aparecem em Mt; provavelmente tradições orais antigas com acréscimos da comunidade e da redação final de Mt.



Um olhar mais atento nos leva a perceber que Mt, para destacar o que considera mais importante para suas comunidades, organizou seu material de maneira muito precisa. A idéia mais importante fica no centro (11,1—13,52), enquanto as outras idéias vão sendo organizadas ao redor, de forma paralela. Partindo dessa possibilidade de estruturar o evangelho de Mt, podemos ter uma proposta de estudo do mesmo.

 

II – Proposta de estudo. Usando uma comparação. A Bíblia é como um coco. Dentro dela existe uma água viva que reanima a nossa esperança e fortalece o nosso caminhar. Mas é preciso um método, uma ferramenta para quebrar esse coco e deixar jorrar água viva da qual estamos sedentos. O nosso estudo é uma ajuda. Queremos chegar à experiência do Deus da vida, o Deus-amoroso, que as comunidades de Mt registraram no seu evangelho. Pois só a vida produz vida.

            Alguns passos importantes deste caminho: A. Escolher um local adequado, para rezar e refletir. Criar um momento propício para o encontro com a Palavra. Pedir luzes ao Espírito Santo. Abrir-se para o diálogo com Deus através da Palavra, da comunidade e da realidade. Ler e reler atentamente o texto escolhido. Procurar informações. Situa-lo no tempo e no espaço. As introduções e notas contidas na própria Bíblia podem ajudar muito neste momento. B. Observar a linguagem, os detalhes, em comparação com outros textos paralelos nos outros evangelhos que estão indicados em algumas edições. Anotar as semelhanças e as diferenças. Elas nos indicam o contexto do texto. C. Captar a realidade que está por trás do texto. Surgem as perguntas que fazemos ao próprio texto: quais são as relações sociais e os conflitos presentes nas relações? Personagens e situação, posicionamento de Jesus, etc... Ver nas entrelinhas... Às vezes, o que não está dito é mais importante do que está dito... D. Descobrir o que Deus nos fala hoje. É o momento de ligar a nossa vida com a vida das pessoas do texto. O Deus presente na história do povo bíblico está e estará presente na nossa vida, falando conosco a partir de nossa realidade. E sua fala é sempre um apelo a um compromisso pessoal e comunitário com a vida, com o outro, com a transformação da história. E. Ao final é o momento de pedir a Deus a graça e a força de colocar sua Palavra em prática. É a hora das preces.

            Cabe ressaltar que o mais importante é o texto bíblico e o nosso compromisso com a realidade em que vivemos. A leitura da Bíblia é condicionada pelo lugar social e pelas opções da pessoa ou da comunidade que a lê.

 

III – Contexto histórico e social. Desde o ano 63 a. C., a Palestina tornou-se uma colônia de Roma, mas os judeus gozavam de certa autonomia, sobretudo no campo religioso, desde que pagassem os devidos impostos ao império. Mt nos dá informações sobre os territórios e seus respectivos governantes (14,3; 27,2). O Templo era o centro da vida social e econômica dos judeus, casa de oração (21,13), local de peregrinações, sacrifícios e ofertas, mas também servia de banco, cartório, tesouro público. A observância estrita da Lei era colocada como exigência do próprio Deus, apresentado com uma rígida imagem de grande rei, justiceiro e castigador.

            Na Palestina havia vários partidos com posicionamentos diferentes em relação ao Império, ao Templo e à expectativa de um Messias (saduceus, fariseus, escribas). O povo era oprimido por estrangeiros e compatriotas, nesse ambiente eram comuns revoltas e levantes.

            Os cristãos, que começavam a se reunir nas casas, pouco a pouco foram se distanciando do Templo. Diante do clima de revolta, saíram de Jerusalém e se espalharam para o além Jordão, norte da Galiléia e Síria.

            No ano 70 d. C., Jerusalém foi tomada pelo exército romano. Após a destruição do Templo, os vários grupos de fariseus e escribas se empenharam na organização e definição da vida e crença do judaísmo. Estes se encontram em competição e conflito com outros grupos como os judeus cristãos. Quando terminou a guerra judaica, o Império Romano se apropriou das terras produtivas dos judeus. A situação da Galiléia, que já era ruim, piorou. Muitos agricultores se tornaram arrendatários, empregados, meeiros e até escravos. No evangelho de Mt há várias parábolas de Jesus que evidenciam o que estava acontecendo. Ricos que moravam fora, arrendavam terras (21,33), outros exigiam dos meeiros mais do que podiam (25,26), sem falar na realidade do desemprego (20,1-7), escravidão (18,23-26), roubos (21,34-39) e exploração do outro (18,27-30).

            O evangelho de Mt surge dessas comunidades do norte da Galiléia e Síria, constituídas de pessoas pobres e exploradas. Comunidades com a presença marcante de Judeus (5,47; 24,20), comprovada pela preocupação de Mt que insiste em mostrar a importância da Lei (5,17-19) e em citar o AT. Nessas comunidades podemos encontrar também muitos judeus com a mentalidade helenista, ou seja, gente que não estava presa à Lei e ao Templo. Além disso, havia estrangeiros fazendo parte das comunidades, haja vista a preocupação de Mt com a missão aos estrangeiros (28,19). Essas comunidades constituíam uma das opções para os grupos judeus no período pós-70.

            Eram muitos os problemas enfrentados, assim as comunidades tiveram de criar instituições, organizar papeis e funções de seus membros, definir normas de comportamento dentro e fora do grupo. Esses fatos moldaram as comunidades que estão por trás do evangelho de Mt e lhe deram características especiais: comunidades mistas e em contínua tensão; inevitáveis conflitos em torno da Lei; conflitos com as comunidades judaicas; controvérsias a respeito da vinda imediata do Senhor, gerando desânimo, mas também vigilância ativa, preocupação com a prática do amor (16,27; 25,31-46) e anúncio da vinda do Senhor.

            Assim podemos compreender que o evangelho de Mt foi resultado não de um só autor, mas as comunidades participaram da redação do mesmo. O local mais provável da redação final é Antioquia, na Síria (cf. At 13).  

 

IV – Desenvolvimento do esquema proposto (pistas).

 

INTRODUÇÃO (1—2)

Ø  “Livro da origem de Jesus Cristo”. (1,1) – lembra o Gn (criação) => em Jesus, inicia-se a nova criação da humanidade.

Ø  Genealogia – muito característico da cultura judaica; ligada a identidade de uma pessoa. Mt quer recordar que Jesus tem profundas raízes no povo eleito. Ele é o Messias prometido; fruto final de uma história de buscas, lutas e vitórias. Diferente de Lc, Mt organiza a organiza em 3 blocos de 14 gerações – inclui cinco mulheres; todas elas com algum problema em relação à lei judaica. Todas eram, de certa forma, excluídas. Jesus é o Messias legítimo, mas de uma família marcada por essas presenças femininas; ultrapassando o racismo, a lei do puro e impuro, numa perspectiva do pobre.

Ø  Jesus é o Deus conosco! (1,18—2,12). – O Filho de Deus tem mãe humana; a iniciativa de Deus encontra acolhida em Maria e resistência em José. Seu modo de ser justo deve ser revisto: a verdadeira justiça que Deus quer é a defesa radical da vida, nas pessoas de uma mãe solteira e de uma criança em gestação. José aprende a colocar a vida acima da lei. O nome do menino: Jesus – “Deus salva” – elimina a separação entre Deus e o ser humano. Os fatos que se desenvolvem em torno do nascimento salientam sua importância (a estrela, cf. Nm 24,17) e também que sua presença é ameaça para alguns e esperança para outros (2,1-23).

Ø  O novo Moisés (2,13-23). A matança dos meninos faz referência ao que aconteceu no Egito, numa constante referência ao AT, Mt busca nas profecias a confirmação para a autoridade de Jesus e ao mesmo tempo apoio para a fé e a vida de suas comunidades. Eis que Jesus nos é apresentado como novo Moisés. Ele é a síntese do mistério da vida, onde Deus toma a iniciativa de oferecer vida, e a humanidade, representada por Maria, acolhe esta vida. O Espírito de Deus que produz vida quando a receptividade e abertura.


I LIVRO: JUSTIÇA DO REINO (3—7)

Ø  Se Jesus pode ser apresentado como semeador, qual a semente que ele espalhou?

Ø  A chegada do Reino (3—4). João Batista prepara a vinda do Reino com o Batismo de conversão (3,1-12). É no deserto que tudo começa para o antigo e o novo povo de Deus. Novos tempos se aproximam; não basta pertencer ao povo eleito. A diferença entre João Batista e Jesus fica clara no batismo que conferem (nas comunidades, havia ex-discípulos de João Batista) e o papel de cada um. O fato de pertencer a comunidade não salva por si só; tudo depende da prática da justiça do Reino. Só em Mt aparece o diálogo entre Jesus e o Batista na hora do batismo.

Ø  A narrativa da tentação está profundamente ligada com o batismo, onde o Espírito de Deus revela quem é Jesus. A este o Espírito leva ao deserto para ser tentado, como o povo no tempo do êxodo (Ex 17,1-7). As três tentações refletem o clima apocalíptico, as expectativas messiânicas do povo da Palestina de tornar Israel uma grande nação, um sonho muito presente nas comunidades de Mt mesmo depois de tantos anos da morte e ressurreição de Jesus. Ele não é um messias triunfalista, demagógico. Ele é a presença de Deus no meio do seu povo. Jesus inicia seu ministério na Galiléia, uma região de judeus e gentios. Aqui Jesus é apresentado como luz para o mundo (4,16). Aqui aparecem os primeiros discípulos.

Ø  Em síntese: Jesus era o filho muito amado que fazia tudo que agradava ao Pai (3,17). Ele supera Moisés porque respondeu às necessidades da vida do povo, que iam muito além do pão. Nas suas comunidades, havia lugar para todos e sua ação libertadora não tinha fronteiras.

Ø  Esta experiência das comunidades nos convida a uma revisão da nossa vida cristã. Um dos pontos de avaliação é o conceito de salvação que carregamos. A participação numa instituição religiosa não dá carteira de cidadão do Reino para ninguém (3,9). Conseguimos captar essa imagem de um Deus solidário com os excluídos?

Ø  O sermão da Montanha (5—7). O primeiro grande discurso. Aqui se apresenta a prática de Jesus como fundamento da nossa maneira de agir, da Igreja que deve ser coerente com a chegada do Reino do Céu.

Ø  Particularidade: se no passado foi Moisés que subiu ao Monte, aqui, o povo sobe com Jesus. Em Jesus o divino e o humano se encontram. Como Moisés ele sobe ao monte, como Deus, ele fala ao povo. Ele é Deus entre nós. Mt apresenta as bem-aventuranças em número de oito, são a síntese da nova lei ou a lei messiânica. Elas retratam de maneira muito clara a situação externa e interna das comunidades que foram perseguidas pelas lideranças judaicas e pelo império romano por causa do evangelho e da nova justiça. Isso está claro na última bem-aventurança. As comunidades que procuravam viver as bem-aventuranças, eram o sal da terra e a luz do mundo.

Ø  A questão da lei (5,17-48). Alguns viam em Jesus um libertador da Lei de Moisés, outros, que Jesus queria cumpri-la nos seus mínimos detalhes. Na realidade a intenção de Jesus não era uma nem outra. Jesus mostra que a Lei apenas aponta para a vontade de Deus. Ela não tem em si a força de realizar esta vontade. Ele observa a lei enquanto reveladora do que o Pai quer. O que não ia bem era no que a lei tinha se transformado: observância mecânica e lucrativa para os bolsos das elites religiosas. Para fazer-las entender ele retira cinco exemplos, indo até a sua raiz, ou seja, busca seu objetivo último que é a defesa da vida.

Ø  A nova lei e a nova obediência dos discípulos é viver uma vida de filhos de Deus reproduzindo sua bondade nos relacionamentos cotidianos. Mais do que a norma, a proposta do Evangelho é fazer da vida um contínuo ato de discernimento das situações.

Ø  Em que se baseiam nossas relações com Deus e com o outro?

Ø  A prática da justiça (6,1-18). Através de três obras de piedade da época, Mt mostra a oposição entre a prática de Jesus e a prática dos fariseus e escribas. O princípio básico é que as obras de piedade não podem ser usadas para ganhar privilégio diante das pessoas e assim adquirir poder. Tal comportamento bloqueia o relacionamento filial com Deus, que nos ama gratuitamente.

Ø  Buscar o Reino de Deus (6,19-34). A comunidade é chamada a escolher a proposta do Reino e deixar para trás tudo o que é anti-reino expresso na justiça que provoca pobreza, miséria, destruição da vida. O espelho para se auto-avaliar e discernir são as bem-aventuranças. O evangelho não nega as preocupações com a comida, casa, saúde, roupa, etc. Esta é a realidade do povo que vive num sistema injusto. A proposta do evangelho é orientar estas preocupações no rumo da solidariedade e da partilha que constroem o Reino. 

Ø  O critério da prática da justiça: fazer ao outro o que gostaríamos que nos fizessem (7,1-28).

 

SEGUNDO LIVRO: UMA JUSTIÇA QUE LIBERTA OS POBRES (8—10)

Ø  O semeador faz surgir as comunidades cristãs (8,1—9,34). Três momentos: a exigência para pertencer ao novo povo; a missão entre os gentios, e a prática de Jesus. Para pertencer ao novo povo é necessário fazer opção pelos pobres e marginalizados e excluídos (8,1-17); na comunidade há lugar para todos; esta opção faz com que atravessemos as fronteiras de raça, pais e se dirija para a outra margem (8,18—9,13); a prática de Jesus cria um novo povo que sabe celebrar a presença do Reino no seu meio (9,13-34).

Ø  Missão do Semeador e das comunidades cristãs (9,35—10,42). Os conflitos internos e com as lideranças judaicas, somadas à perseguição romana, enfraquecia o empenho missionário. Em resposta a esta situação temos o discurso de Jesus sobre a missão.  


TERCEIRO LIVRO: UMA JUSTIÇA QUE PROVOCA CONFLITOS (11,1—13,52)

Ø  Junto com o trigo brotou também o joio, o que dificulta a colheita. O centro do evangelho.

Ø  Incompreensão e hostilidade (11-12). Primeiro temos uma grande revisão do que foi visto até agora: a identidade de Jesus (os discípulos de João); rejeição da elite (11,16-19) e cidades onde estão as sinagogas. Onde alguns rechaçam a pessoa de Jesus, os pobres e os pequenos acolhem (11,25-30). No atrito entre Jesus e os seus opositores está a interpretação e a prática da lei (12,1-14). Jesus mostra quem ele é a partir da imagem descrita pelo profeta Isaias (12,15-21). Imagem não muito agradável em Israel. Jesus amplia o horizonte e constitui o novo povo formado de judeus e não judeus, onde há lugar para todos os que acolhem o desígnio do Pai expresso nas bem-aventuranças. Neles Jesus reconhece a sua família (12,46-50).

Ø  O mistério do Reino do Céu (13,1—52). Através de sete parábolas, Jesus apresenta a natureza surpreendente do Reino do Céu. Na parábola do joio e do trigo, Mt tenta explicar como no Reino e na Igreja coexistem filhos e filhas do Reino e filhos e filhas da iniqüidade. Há que se esperar pacientemente o fim do mundo, quando virá o Filho do Homem para separar uns e outros. É esta a mesma situação da comunidade hoje.

Ø  O Reino do Céu está aí com toda a sua potencialidade e força. As comunidades não podem desencorajar-se diante das perseguições. Nessas circunstancias, o juízo final assume um valor pedagógico para Mt estimular a sua Igreja no seu compromisso de vida. É preciso fidelidade na prática da palavra de Jesus. O reino é comparado a uma pérola e a um tesouro. Vale a pena empenhar a vida na luta por ele.

 

QUARTO LIVRO: O NOVO POVO DE DEUS (13,53—18,35).

Ø  O novo povo de Deus é desafiado no seu crescimento pelas forças de destruição presentes na história. Para resistir, faz-se necessários cuidados especiais para que o fruto cresça e nada se perca.

Ø  O semeador e o novo povo de Deus (13,53—17,27). Uma grande narrativa em torno da pergunta: quem é Jesus? Ou: quem são as comunidades dos discípulos de Jesus? O comprometimento com a causa da justiça é o ponto de encontro daqueles que seguem Jesus. É a comunidade cristã que continua a presença e a prática de Jesus, o Semeador, no meio do mundo. Como deve se comportar a comunidade? Qual a mística que sustenta a comunidade?

Ø  A comunidade dos pequeninos (18,1-35). Instrução de Jesus a seus discípulos. Aqui se encontra a síntese da experiência das comunidades de Mt. A idéia básica é a gratuidade do amor de Jesus, que faz a moldura do texto (vv 1-5;23-35). Esta deve ser a raiz do comportamento dos membros das comunidades cristãs. Sem esse espelho, podemos nos tornar meros executivos da lei e cometer abusos de poder. No centro da cap. Mt coloca Jesus Ressuscitado, presente no meio da comunidade (vv. 19-20), eixo do evangelho.

 

QUINTO LIVRO: A VINDA DEFINITIVA DO REINO (19—25)

Ø  O texto insiste nas instruções de Jesus a seus discípulos: uma parte narrativa (19—23) que mostra que o Reino é para todos e uma parte discursiva (24—25) que convida à vigilância ativa e aponta o futuro do reino a ser construído pela prática da justiça baseada na misericórdia.

Ø  Instruções do Semeador aos seus discípulos (19—23). Ele sobe a Jerusalém; no caminho vai formando os seus discípulos. Dá-se o confronto decisivo com os eleitos que o condenarão e entregarão ao poder romano para que o matem. Mt insere várias parábolas que retratam a rejeição de Jesus (21,28—22,14).

Ø  Discurso escatológico: a vinda do Filho do Homem (24—25). No cap. 24,1-44 o evangelista combina o anúncio da destruição de Jerusalém com achegada do fim do mundo. E acrescenta ainda algumas parábolas para incentivar as suas comunidades a esperar o fim do mundo numa vigilância ativa: 24,37—25,30, praticando o amor e a misericórdia, porque este será o grande julgamento quando Jesus voltar: 25,31-46.

 

CONCLUSÃO: A PÁSCOA DA LIBERTAÇÃO (26—28)

Ø  É o auge do conflito, o Semeador dá a vida por sua lavoura. As comunidades cristãs estão desanimadas e necessitam de uma razão forte para sobreviver. Eles relêem a paixão de Jesus à luz da Páscoa e das Sagrada Escrituras e concluem: o Semeador do Reino é Jesus, o filho muito amado do Pai, que faz tudo o que lhe agrada. Sua morte foi conseqüência de sua fidelidade à vontade do Pai, expressa nas escrituras. Ele a assumiu livremente. Ele esteve, está e estará presente no meio do povo até o fim do mundo (20,20; cf. Ap 1,8).

Ø  Paixão e morte de Jesus (26—27). Um tipo de catequese para ajudar as comunidades cristãs a crescer na fé e sustentá-las na perseguição. O grande enfoque é a relação de Jesus com seus discípulos, que agora vêm o outro lado da cena da transfiguração (17,1-8), embora não tenham entendido nem uma coisa nem outra!

Ø  A ressurreição de Jesus (28,1-20). Não há nos evangelhos a pretensão de descrever como foi a ressurreição de Jesus, mas a situação das comunidades frente a este fato. Assim percebemos que este capítulo é quase todo exclusivo de Mt. Percebe-se que a comunidade precisava explicar o sumiço do corpo de Jesus, em resposta às dúvidas que circulavam nessa época. Tal boato, conclui Mt, foi espalhado pelo judaísmo. Neste texto as comunidades de Mt dão o troco, dizendo que seus adversários subornaram os guardas. O novo encontro com os discípulos se dará no lugar de sempre: na Galiléia. A insistência nesta região é para mostrar que Jesus Ressuscitado é o mesmo Jesus de Nazaré que iniciou sua missão na Galiléia, terra dos gentios (4,12-17). E o lugar do encontro com o Ressuscitado é na comunidade, assumindo a sua mesma prática de justiça e fraternidade.

Ø  Ao final, o texto se apresenta como uma pequena catequese para responder a certas dúvidas sobre o que significa crer na ressurreição. Jesus sempre usou o seu poder para executar e proclamar a vontade do Pai e para concretizar, aqui e agora, o seu Reino. A comunidade sabia que também havia recebido esses poderes (9,8;10,1) e era portadora da semente do Reino entregue por Jesus (5—7). A ressurreição abre esse mundo novo. Jesus é o Senhor da História. Com esse poder Jesus envia a comunidade dos seus seguidores ao mundo, a todos os povos (24,14;25,32), para continuar sua missão anunciada pelos profetas (Is 42,6,49,6;60,3). Jesus está presente no duro caminhar das comunidades, com a força da ressurreição. Jesus ressuscitado não é um fantasma. Ele é o mesmo Jesus da Galiléia, Messias dos impuros, excluídos. Ressuscitar é seguir esse Jesus, Semeador do Reino, com a prática da nova justiça, a partir da misericórdia e da solidariedade.

 

Fonte: “Ele está no meio de nós! O semeador do Reino” – O Evangelho de Mateus – CNBB – Síntese: Pe. João Bosco Leite.