Livros Históricos – Josué

 

Introdução: os que aqui chamamos de livros históricos, podem ser também identificados como livros proféticos. Na bíblia hebraica: Josué, Juízes, Samuel e Reis são considerados “profetas anteriores”, em contraposição aos “profetas posteriores” como Isaias, Jeremias, Ezequiel e os 12 profetas menores. São assim chamados, por tradição, por causa da sua composição: Josué seria o autor do livro que leva o seu nome; Samuel teria escrito Juízes e Samuel, e Jeremias seria o autor de Reis.  Tal tradição se justifica pelo caráter religioso que lhes é comum: as relações de Israel com Deus, sua fidelidade ou infidelidade, sobretudo a infidelidade à palavra de Deus, cujos porta-vozes são os profetas. Nestes livros, os profetas intervêm com frequência: Samuel, Gad, Natã, Elias, Eliseu, Isaias, Jeremias e outras figuras de menos destaque.

O estudo atual os considera livros históricos, e ocupam a maior parte do AT. Neles encontramos a história de Israel e do judaísmo, desde a conquista da terra prometida até quase a época do NT. O que temos nestes livros não é uma crônica de fatos, mas uma interpretação de acontecimentos a partir da fé, e a serviço dos problemas e interesses de situações bem determinadas. Podemos dividi-los em quatro grupos:

A. Josué, Juízes, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis. Formam um relato mais ou menos contínuo, apresentando a história do povo desde a conquista da terra até o exílio da Babilônia. Tais livros mostram que a história de Israel depende da atitude que o povo toma na aliança com Deus. Se o povo é fiel à aliança, Deus lhe concede a bênção, que se concretiza no dom da terra e na propriedade. Se o povo é infiel, atrai para si mesmo a maldição, que se traduz em fracasso histórico e perda da terra.

B. 1 e 2 Crônicas, Esdras e Neemias. O tempo pós-exílico babilônico. A preocupação básica é fundamentar e organizar a comunidade depois do exílio da Babilônia. Para isso, seus autores repensam toda a história do povo, a fim de fundamentar a vida da comunidade judaica e sua forma de governo, polarizada pelo culto no Templo de Jerusalém.

C. Rute, Tobias, Judite e Ester. Mais do que história propriamente dita, esses livros são novelas ou romances. Sua intenção é apresentar modelos particulares de vivências e aplicação da fé dentro de situações difíceis, principalmente as enfrentadas pelos judeus fora de sua terra.

D. 1 e 2 Macabeus. Relatam a resistência heroica de um grupo de judeus diante da dominação estrangeira que ameaça destruir a identidade cultural e religiosa da comunidade judaica.

O conjunto histórico que agora vamos estudar (Js, Jz, Sm e Rs) é um grande “evangelho”, um anúncio que procura suscitar a conversão e a esperança. Para nós ele se torna um convite a também lermos a nossa história através da bênção e maldição, da fidelidade e da infidelidade ao projeto de Deus. É possível rever a nossa história, descobrir os erros que a paralisam e projetar a ação que abre o futuro da esperança.

 

1. O Livro de Josué. Relata acontecimentos situados no sec. XIII a.C. – a conquista e partilha de Canaã, a terra Prometida, pelas tribos de Israel. À primeira vista, o livro apresenta a tomada global da Terra, feita por uma geração. Isso se deve a idealização do autor. A conquista foi, de fato, um processo longo e lento, ora pacífico, ora violento, que só terminou dois séculos mais tarde, com o rei Davi.

 

- Os padres da Igreja reconheceram, a partir da figura de Josué, que do começo ao fim é o personagem principal, uma prefiguração de Jesus: não apenas tem ele o mesmo nome, salvador, mas também a passagem do Jordão, que, com ele à frente, da entrada na Terra Prometida; é a imagem do batismo de Jesus, que nos dá acesso a Deus; a conquista e a divisão do território tornam-se a imagem das vitórias e expansão da Igreja.

 

- O grande tema do livro e a Terra Prometida. O povo que havia encontrado seu Deus no deserto, recebe agora a sua terra, e a recebe do seu Deus. Deus combate em seu favor e lhes dá em herança o país que prometera aos Pais.

 

2. Divisão do Livro: em três partes:

1ª – Cap. 1—12 – A conquista. A narrativa se restringe a uma área, tendo como pano de fundo o santuário de Guilgal, próximo de Jericó. Este está situado no território da tribo de Benjamim (narrativas provindas dessa tribo e de Efrain). A preocupação é de dizer, explicar fatos, nomes de lugares, edificações e ruinas para uma geração que vive muito tempo depois.

2ª – Cap. 13—21 – A Partilha da Terra entre as tribos. Serve dos documentos geográficos que descrevem as fronteiras das tribos e que remontam à era pré-monárquica, de listas de lugares e cidades, provenientes do tempo da monarquia.

3ª Cap. 22—24 – O fim da vida de Josué. Consta de três conclusões: retorno das tribos transjordânicas para seus territórios (22); último discurso de Josué (23); aliança em Siquem e morte de Josué (24).

 

3. Considerações gerais.

- Nos encontramos diante não de uma crônica, mas de uma interpretação dos fatos para mostrar o significado da conquista de Canaã. A personagem principal é a Terra Prometida: Deus realizou a promessa feita aos patriarcas e renovada em seus descendentes. O povo foi libertado da escravidão do Egito para ser livre e próspero na terra que Deus ia dar. Por trás das longas e minuciosas listas de lugares devemos ver a alegria e a gratidão pelo dom de Deus.

- O que chama a atenção é o fato do povo ter que conquistar a terra que Deus lhe deu. Deus concede o dom, porém não suprime a liberdade e a iniciativa do homem. Pelo contrário, supõe e exige que o homem busque e conquiste o dom de Deus. A terra é fruto da promessa e dom divino e, ao mesmo tempo, da aspiração e da conquista do homem. Em outras palavras, Deus promete por dentro das aspirações do homem, e realiza seu dom por dentro das conquistas do homem.

- O livro de Josué constitui um impecável tratado sobre a graça de Deus, que é a base da vida e da história. A graça não é dom paternalista de Deus, deixando o homem passivo. Ela é dom que Deus faz das possibilidades já contidas na estrutura de toda a criação, e principalmente da pessoa humana. Sem a atitude livre e responsável que procura descobrir, tomar posse e endereçar as possibilidades, o homem jamais encontrará a graça. A vida é dom de Deus que o homem deve descobrir e conquistar.

- Tudo se concretiza na tensão histórica que existe entre o presente efetivo de Deus, que abre seu dom nas possibilidades, e o presente-futuro do homem que busca, descobre, toma posse e dá endereço ao dom de Deus. E para que o dom se torne vida concreta, Deus coloca uma só condição: que o homem seja e continue sempre seu fiel aliando.

 

 4. Na liturgia da Palavra dominical. Encontramos textos desse livro no Ano B – 21º Domingo do Tempo Comum (Js 24, 1-2a.15-17.18b); Ano C – 4º Domingo da Quaresma (Js 5,9a.1-12).

-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------